sexta-feira, 11 de março de 2011

rosas recolhidas


escuta:
a chuva chora as lágrimas
que alguém recolhe
claramente para dentro
com o alheamento das rosas


há sempre alguém
que se esconde na chuva
e não orvalha o rosto
com o que lhe chora dentro

é uma coisa
que decorre da cadência
de cada gota

éguas soltas e molhadas
ao longe, claramente lentas
num campo de flores minúsculas
rochas ensopadas, pedras soltas

aves resignadas
como mãos, caídas,
o voo retido pela chuva ouvida
em que pensam as aves
quando não voam?

depois, há a água dos teus olhos,
líquida, azul esmaecida
um excesso de sal na tarde
a vida recolhida na paisagem que te arde

a chuva aproxima-te da fonte
bebes o silêncio da árvore sorridente
o que pensarás das lágrimas ouvidas?

não são minhas
são de alguém
que ninguém suspeita

e declina a vida no lamento da chuva
nesta tarde de gaivotas e nuvens difusas

ouve, meu amor, como o rumor da chuva
nos retira do tempo: rosas distraídas
em suspenso e lágrimas como folhas
molhadas - por dentro.