segunda-feira, 18 de agosto de 2008

diálogo só

e depois que julgas tu, que tanto calas
que pensas tu que tanto julgas
que dizes tu que tanto silencias?
que força nos coíbe se nos empurra
que firmeza nos inquieta
quando nos derruba
que equilíbrio nos desaba
quando nos segura?
que enigma nos afasta
que sombra nos ilumina
e abafa?
que claridade
nos esconde na neblina?

eu sei, amado
como nos queima o noivado
que o céu nos prometeu
e como, noivando no céu,
na terra o amor nos perdeu.

como caberá um corpo num poema?
e um abraço como rima na distância
se a poesia é uma ave que não pousa
e o beijo é união que só aflora
e nunca se ousa?

ensina-me a letargia dos montes
o diapasão do sangue
e o rendilhado dos rios
sob as tuas altas pontes

traduz-me o risco e o realce
a nudez de cada cor quando a abres
quando derramas a cal sobre a calçada
diz-me que me diz a dor caiada
e o quarto acimentado que cadáveres guarda?

decanta-me do silêncio
o pólen prolongado
reduz a margem do meu leito
corre-me veloz, como um cavalo louco
entre as flores de um campo lavrado
pelos meus sonhos desfeitos

não me cubras com um véu de neblina
mais espesso que o próprio tempo
mais cego que a própria cegueira
não mates já a minha pele
que um dia será cinza e poeira


beijinhos