quinta-feira, 17 de julho de 2008

para ti, flores...

teço lírios para ornar o silêncio, quando só a minha voz ficou e nada te anuncia... temo as solas gastas das palavras, tanto caminharam desertas de significado que se romperam, corroídas de sal. tinjo flores para ti, para me saberes entretida neste bocado da noite onde nunca vens. a corrente leva-me com muita força, e já pouco mais tenho a fazer aqui, se nunca estás. o teu desprezo atinge-me como uma lâmina. já me disseste tudo o que te restava. só o mutismo ostensivo te sobrevive, carregado de palavras. a tua indiferença responde ao grito das cores e ao sangrar das palavras. não me sinto só, sinto-me do outro lado da ponte e vai tão alta a maré que nem diviso já a tua margem. estendo o braço, talvez ainda me alcances antes de me devorar o turbilhão manso das águas. que será de nós quando o Verão me levar a saia esvoaçante e a liberdade do riso, quando o frio nos laminar no zinco da cabana o corpo recolhido? nunca me quiseste ou invadirias as noites e os meus sentidos porosos de ti, saberias beber a minha essência e revigorar-me o corpo e as palavras. mas tu insistes em empurrar a corrente que me quer na outra margem. ostracizada do mundo, o exílio da pele apenas me pede paz, mas sem ti nenhumas palavras medram limpas e valiosas, como pérolas no escuro de uma mina abandonada... nada ousa a lira dedilhada da poesia... estou só entre muralhas proscritas e apagadas.