Imagem de Paula Goddard
Deixa-me ser florida e pueril mais uma vez, são tantas as pessoas que te estendem a capa da morte, que acabaste por vesti-la aos Domingos e quartas de manhã. Estou aqui entre um céu de espadas ou de lírios, a opção depende só de mim, quero melancolia, procuro a nuvem mais negra e espalha-se sobre o meu coração um veneno vivo, vagamente doce. Quero euforia e procuro a mancha azul que deixa ver claramente o sol, ou adivinho-o sob a pele, a minha e a tua, como se mel da noite fosse e ainda fresco. Assim balanço o dia que te quero oferecer, sem hinos, sem grinaldas nos cabelos, sem a perfeição do jade, sem a penetração íntima do diamante, ou o mistério verde da esmeralda, mas como se fosse uma laranja, um fruto perecível, água de hoje, e só para hoje, uma laranja para cada dia. Desculpa, mas não te posso oferecer um laranjal, a constância do tempo manda que tudo seja uma só vez, e irrepetível no mesmo momento, por isso hoje não me peças o tudo que há na vida, porque não o tenho. Nem sequer já tenho muita vida em quantidade de dias, horas, minutos e segundos, mas sabes, em cada um dos espaços mínimos de tempo planto laranjais secretos que te vou mostrando escondidos nas palavras, ou na tarde das palavras, ou nas palavras tarde e cedo como estas. E isso é tanto ou muito ou nada, consoante saibas beber o sumo lentamente, ou de um só ávido trago.
Bom dia, longo dia, hoje!
Bom dia, longo dia, hoje!