o discurso amoroso é como o palpitar das plantas. não se diz em oratória elaborada, não se ouve com os órgãos habituais, nem desce à fala onde perderia o pulsar secreto, a sintaxe oculta contida no sangue. não te sei dizer nesta noite de lua brumosa a razão fundamental das coisas, nem sequer posso asseverar que conheço a razão das palavras, quando me avançam assim alinhadas em segmentos e sons... Sei que o discurso a que chamam de amoroso pode ser simplesmente um sinal, um simples risco no tamanho do céu, uma nuvem sublinhada na página que a contém... ou pode ser apenas um pressentimento que nos abre de para em par as portadas do amor. o discurso amoroso não é um conjunto de símbolos e semiótica solta, sentida e parafraseada por intelectuais de óculos fumados. é pegar-te ainda na mão e sentir o pulso, verificando a quantos roda, a quantos pára, a quantos se esbate, a quantos se oculta.
desmedidamente beber-te na (dis)fluência das palavras. se eu te dissesse nesta noite o tamanho do meu querer, teria de repetir os grãos de areia um a um, os que enterrei e os que andam ainda jubilosos por aí, na condição de coisas idas, já sem outra serventia que a de encher vazios e dunas que não vivi. mas sabes? começava tudo uma e outra vez, por todas as vezes e por cada uma que o apogeu nos tocou. um discurso amoroso que calaria todas as tentativas de meramente falar. como se eu fosse verdade e tu também. como se não te entediasses com o que tanto as palavras replicam, como se o sangue não fosse afinal o lugar maior do meu segredo antigo.