vivemos no deserto, meu amor
armamos as estrelas nas janelas
das muralhas que ficaram doutras eras
estendemos tendas na poeira
e contemos tempestades
sibilantes nas seteiras
não é preciso falar, só sentir
o lugar dos cardos, as correntes
as areias voláteis do interior dos ossos
os lugares quentes, o abrigo do vento
o abraço aceso, lâmina, luva,
rasa por dentro
silêncio de dunas e de memórias
palavras que esventro de noite
só para inventá-las novas e nuas
na sua marmorite iridiscente
a as palavras às vezes são sombras
entrelaçadas como folhas e serpentes
meu amor, não temas que o silêncio
te pareça a aridez destas areias
o que não ouves, nave ou névoa
que se apresente,
é o rumor das raízes pelas dunas
que buscam água e brotaram
novamente