caminham-nos alterosas
as vagas do Inverno
vemo-nos entre vidros esbranquiçados
vidros baços como nuvens
onde escorrem húmidos pensamentos
sonhadas paisagens de urzes
e as mãos enredadas no tricot
com que tecemos o tempo
é a hora do recolhimento
abriga-te na asa mais quente
da ave que te morar dentro
extermina as alvoradas, se puderes,
cancela-te no mundo que te espera, o mais que possas,
pois alvas são as primaveras inventadas pelas crianças
e descuidadas são as pastorícias dos sonhadores
e outros iguais guardadores da esperança
regressa pelos campos ao teu tempo
aquele que só tu cultivas em canteiro
renuncia ao vil assento das quantias dispensadas
e dos perdidos inúteis contadores de tempo
tudo foi; outro será o que ainda podes ser
mesmo que sorvas o inverno e a pele antiga
nada deixes em branco, preenche tudo
com cores, com traços, mas que sejam coisas vivas
tais como leguminosas flores e abraços,
ou roupas garridas e leves
os sorrisos de formosas raparigas
ou das aves com que sonhas e
suas penas proibidas
que tudo enfim sejam rosas breves
e tensas alegrias, o sumo dos espinheiros
bebe-o em silêncio e sara com a dor as tuas feridas
iremos juntos atear os beijos dos palheiros
e os suspiros das searas se vierem, em breve,
as manhãs frescas soalheiras
ou ficaremos na esperança do vinho novo
que venha, viril e virtuoso
acender-nos no sangue a febre íntima
da última sementeira